CM 25-03-2013
Pai esteve impedido de visitar a filha durante quase oito anos. A demora do tribunal custa dinheiro ao sistema.
O Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN) confirmou a condenação do Estado português ao pagamento de uma indemnização de 15 mil euros a um pai, pela demora dos tribunais a decidir um processo de incumprimento do regime de visitas à filha.
A decisão demorou quase oito anos, período durante o qual o pai se viu impedido de exercer o seu direito de visitas, ficando assim impossibilitado de "estar com a filha, de acompanhar o seu crescimento, de partilhar as suas alegrias e tristezas".
Em acórdão a que a Lusa teve acesso, o TCAN considera que foi violado o direito a uma decisão jurisdicional "em prazo razoável".
Para a advogada do pai, esta é uma decisão "importante" para contrariar a tendência de, no pós-divórcio, certos progenitores, sobretudo as mães, desenvolverem processos de alienação parental, surgindo assim os casos típicos "dos filhos órfãos de pais vivos".
No caso em apreço, o TCAN considera que, face à falta de acordo dos pais quanto ao regime de visitas, cabia ao tribunal dirimir o conflito "de forma célere", de modo a assegurar que pai e filha "pudessem usufruir da companhia e presença" mútuas, "evitando, como sucedeu, que os laços entre ambos se rompessem".
Em causa um casal da zona do Porto, que se separou em 1993, numa altura em que a filha de ambos tinha quatro anos.
A criança ficou à guarda da mãe, tendo o pai direito a visitas em fins de semana alternados.
Em maio de 1995, o pai entregou a criança dois dias mais tarde do que o estipulado, sendo que a partir daí a mãe nunca mais permitiu o contacto entre os dois.
No ano seguinte, o pai deduziu incidente de incumprimento do direito de visitas, no Tribunal de Família do Porto, que só viria a ser decidido em outubro de 2009.
Uma demora que levou a que filha tivesse crescido sem a presença do pai e com "uma imagem denegrida" do mesmo, o que fez com que se desenvolvesse uma "relação afastada e complicada" entre os dois.
O incidente deduzido pelo pai acabou por ser arquivado, já que o tribunal considerou que o tempo que passara sem que pai e filha tivessem tido qualquer contacto "acarretou o rompimento dos laços familiares existentes entre ambos", o que impossibilitava a retoma do regime de visitas fixado, por se mostrar "desajustado da realidade".
Em 2004, acabou por ficar definido, a pedido do pai, que este visitaria a filha sempre que ela o desejasse.
O pai pedia ao Estado uma indemnização de 60 mil euros, pelos danos não patrimoniais sofridos com esta demora da justiça, com o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto a dar-lhe parcialmente razão e a fixar aquele valor em 15 mil euros.
O Estado recorreu para o TCAN, alegando que o tribunal e o Instituto da Reinserção Social tinham tido "uma prolongada e incessante atividade" no sentido de assegurar um regime de visitas que permitisse à menor e aos progenitores "manterem contactos regulares".
Alegou ainda que a menor já manifestava "receio e apreensão perante a perspetiva de visitar o pai, pelo que não teria sido o tempo de pendência do processo a causa do rompimento dos laços familiares entre ambos.
"Esses laços familiares já não se encontravam sólidos, com prejuízo para o equilíbrio emocional da menor, e o tribunal fez tudo o que estava ao seu alcance para os salvar", acrescentou o Estado.
Argumentos que não convenceram o TCAN, que considerou o tempo de decisão "manifestamente excessivo", sublinhando que o Estado "será sempre responsável pela desorganização do aparelho judicial".